domingo, 23 de outubro de 2022

Esperando Bojangles mostra que nem todo mundo está preparado para a vida real.


Um homem perde seu cachorro e mesmo após 20 anos e uma dor dilacerante que pouco suaviza, ele dança para as pessoas. Dança na cela de uma cadeia, esfarrapado. Dança pra manter viva a memória de seu grande companheiro, Dança pra continuar a viver.


Mr. Bojangles, música de Nina Simone é tocada inúmeras vezes em Esperando Bojangles, filme francês dirigido por Régis Roinsard, apresentado este ano no Festival Varilux e que estreia nos cinemas no próximo dia 27 de outubro.


Assim como na música, o filme é dança. Uma dança sobre a loucura e uma homenagem a ela. Uma dança sobre a vida adulta, as responsabilidades e suas consequências.


O longa conta a história de Camille, George e o pequeno Gary, lindamente interpretado pelo menino Solàn Machado. George, um vigarista, e Camille uma linda mulher se apaixonam à primeira vista, se casam horas depois de se conhecerem e, numa capela abandonada, são abençoados única e exclusivamente pela luz divina do lugar.  Desse grande amor, nasce Gary, um menino doce que fala como adultos, vive em meio a festas e tem como animal de estimação um pássaro grande e exótico de nome Madeimoiselle Supérflua. 


O mundo de Gary é de histórias, sua vida e a de seus pais de fantasias, de festas e nada parece poder abalar esse amor tão grande. Parece não existirem problemas, parece não haver responsabilidades e é nesse meio termo entre o vida real e o mundo encantado que vamos despindo Camille, uma mulher independente, linda  - ora princesa, ora atriz, de nomes que mudam a cada dia da semana, assim como se muda de roupa diariamente - e que enlouquece.


Talvez pelo peso da responsabilidade, por ser mãe ou por ser mulher, Camille lembra Mabel, personagem de Gena Rowlands em "Uma mulher sob influência", de John Cassavetes. Tem o mesmo tratamento que ela, inclusive. É dopada, amarrada, leva choques, jatos d’água para que volte a uma consciência que talvez, nela, Camille, jamais tenha existido.


A cor do filme muda, inclusive, de acordo com seu estado de espírito. É quente e colorido quando está feliz e frio e escuro em seu sofrimento quando percebe a realidade em volta de si.


Assim como Mr.Bojangles, Camille não podia parar de dançar. Assim como para Mabel, o peso da vida real era demais pra ela e mesmo sendo resgatada e amparada por seus grandes amores da vida, George e Gary, Camille se torna Ismália, personagem do poema de mesmo nome do poeta Alphonsus de Guimarães e, numa torre, vê uma lua no céu e uma outra lua no mar.


Roinsard nos provoca riso, choro, raiva e nos dá uma viagem à França, à Espanha, uma viagem entre o sonho e a realidade e não tem como não se emocionar com essas três personagens e com esse grande amor.


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