sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Em "A Baleia", Aronofsky nos mostra que é impossível alguém ter empatia perante a obesidade

 


Não é fácil assistir ao filme de Aronofsky. Não é fácil ver aquele homem daquele tamanho, sofrendo, se empanturrando de comida quando triste ou nervoso e não fazermos um paralelo com a vida que a gente leva, com as tristezas presas aos ombros ao longo dos tempos e dos nossos dia a dias.

Pra mim, foi doído demais assistir ao filme "A Baleia", dirigido por Darren Aronofsky e que estreou nos cinemas brasileiros no último dia 23 de fevereiro.

Foi doído porque por centenas de vezes me senti triste, estressada, nervosa e desamparada e foi na comida que encontrei conforto e, posteriormente, culpa.

Não sou uma pessoa gorda e estou muito longe da obesidade mórbida, mas há anos luto para chegar a um peso que tinha e que, provavelmente, não terei mais. Sinto dores nas costas, nos pés, no joelho e sei que todas essas dores não são apenas por conta da idade, são por conta de um excesso de peso que me custa perder, justamente porque ainda é na comida que eu encontro momentos de alívio, mas um alívio que dói, e que é algo que parece ser quase impossível de fugir.

No filme, Charlie, interpretado brilhantemente por Brendan Fraser, é um professor de inglês que, por sua condição de obesidade mórbida, ministra suas aulas de maneira on-line e com a câmera do computador desligada, justamente para que seus alunos não tenham repulsa de sua aparência obesa e deformada.

Charlie se recusa a ter ajuda, talvez por sua vida não ter mais sentindo após a morte de seu namorado. Aliás, foi isso que  levou a ganhar tanto peso a ponto de chegar à situação que chegou.

Pra mim, essa recusa de querer ajuda não me incomoda, mas me incomoda o fato de que pras outras pessoas, está tudo bem.

A própria amiga/enfermeira (Hong Chou) que o ajuda, sabe que ele está morrendo, está presente em momentos como engasgos, fortes dores no peito, diz que se preocupa com ele, mas o ajuda, de certa forma, a se matar lentamente. Não insiste que ele deve ser internado e, após um engasgo forte enquanto comia um lanche que ela mesmo lhe deu, ela pega o mesmo lanche e diz que ele pode continuar comendo.

Não sei se Aronofky quer que tenhamos pena desse homem imenso, mas se é isso, ele exagera e muito, chegando a ser um tanto quanto irritante. 

A gente sente pena por ele ser do tamanho que é, a gente sente pena por ele sofrer por conta da morte de seu grande amor, a gente sente pena pela forma que a filha o trata, sente pena da maneira como os poucos com quem ele tem contato o veem, ou seja, tudo é um exagero sem fim.

Exagerada também é a música colocada no filme, uma música sempre num crescente irritante pra que tenhamos a impressão que estamos mergulhados no mar acompanhado de baleias.

Por falar nisso, apesar de podermos associar o tamanho de Charlie ao de uma baleia, a impressão que se tem é que ele seria o Jonas dentro da baleia. ao longo de uma semana, acompanhamos Charlie preso dentro de casa, uma casa cinza e com pouca iluminação, com um exterior sempre chuvoso e, de certa forma, assim como a passagem da Bíblia, em busca da redenção divina.

Redenção essa que deveria vir de seu acerto com a filha, interpretada por Sadie Sink que não conseguiu deixar de lado seu papel como Max de Stranger Things. Ela é brusca e arredia como Maxine, mas, diferente do universo adolescente da série, nem Brendan Fraser consegue salvar a sua atuação.

Enfim, a gente dica angustiado diante daquele homem gigante, mais gigante ainda pelo fato de Aronofsky ter optado por filmar em tamanho 4:3 justamente para nos dar essa impressão de aperto e ficarmos incomodados com aquele personagem, mas é, de certa forma, um filme problemático já que não mostra uma só pessoa tendo uma atitude diferente perante aquele homem obeso à beira da morte, Ele reforça que a obesidade só leva ao sofrimento, ao preconceito e não há absolutamente ninguém que possa ter um olhar humano diante dessa situação.

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